Sinais de alerta: identificando distúrbios alimentares pediátricos, por Maria Fernanda Cestari de Cesar, MAFE
No meu dia a dia, tenho acompanhado de perto os desafios que muitas famílias enfrentam com relação à alimentação de suas crianças. A seletividade alimentar, os distúrbios ou transtornos alimentares são preocupações significativas, que podem impactar a saúde e o desenvolvimento. Reconhecer os sinais de alerta é fundamental para buscar a intervenção adequada o mais cedo possível. Aqui, compartilho alguns indicadores importantes tanto para crianças com desenvolvimento típico quanto atípico.
Mas antes de começar, vamos entender qual a diferença entre distúrbio alimentar pediátrico (DAP) e transtorno alimentar restritivo evitativo (TARE). O distúrbio alimentar é um termo guarda-chuva que se refere a uma variedade de dificuldades alimentares em crianças. Essas dificuldades podem incluir disfunção médica, nutricional, alimentar e/ou psicossocial. Ou seja, é definida como ingestão oral prejudicada que não é apropriada para a idade.
Já o transtorno alimentar restritivo evitativo (TARE) é caracterizado pelo cardápio alimentar limitado com alimentos que as crianças (e adultos) se sentem seguros e confortáveis ao ingerir. A restrição decorre pelas preferências sensoriais (cheiro, sabor …) ou da textura dos alimentos (crocante, mole…). Em alguns casos, essa restrição ocorre devido a experiências traumáticas com a comida, como engasgar, vomitar. Em outros, é devido ao baixo apetite e ansiedade rem relação à comida. Ou ainda, rigidez e medo de mudanças, ou seja, confio apenas no meu salgadinho de marca específica e coloração amarela.
Sinais de alerta para distúrbio alimentar pediátrico
- Recusa de determinadas texturas:
Se a criança constantemente recusa determinadas texturas, como os grãos, por exemplo, pode ser devido a problemas motores orais e necessita de avaliação com fonoaudiólogo. - Dieta restrita:
Uma dieta limitada a um número pequeno de alimentos, exclusão de grupos alimentares ou a preferência em comer apenas certos alimentos preparados de uma maneira específica. - Medo de experimentar novos alimentos:
Crianças que mostram medo ou ansiedade significativa ao experimentar novos alimentos. - Reações físicas exageradas:
Crianças que apresentam complicações gastrointestinais, náuseas, vômitos ou engasgos frequentes precisam realizar avaliação com o médico. - Comportamentos de evitação:
Comportamentos como sair da mesa, chorar, não aceitar comer sem distrativos eletrônicos ou até mesmo esconder alimentos podem ser indicativos de problemas alimentares.
Sinais de alerta para transtorno alimentar restritivo evitativo
- Evitação consistente de grupos alimentares:
Crianças que evitam constantemente determinados grupos de alimentos, como frutas, vegetais, carnes, ou alimentos com certas texturas ou cores, e essa aversão persiste por um longo período. - Preocupação excessiva com as consequências do comer:
Medo intenso de engasgo, vomitar ou ter uma reação alérgica. - Alteração de peso e/ou crescimento:
Dificuldade em ganhar peso ou crescimento inadequado para a idade, são sinais de alerta importantes e necessitam de investigação médica e nutricional. - Impactos no social:
Dificuldade em participar de refeições familiares e/ou eventos sociais que envolvem comida. - Baixo interesse na comida:
Demonstra pouco ou nenhum interesse em comer, ou considera a alimentação uma tarefa incômoda. Esquecendo, muitas vezes, de alimentar-se.
Considerações para crianças atípicas
Para crianças com condições atípicas, como transtornos do espectro autista (TEA) ou transtorno de processamento sensorial, os sinais de alerta podem se manifestar de maneira diferente ou ser mais intensos. É importante observar:
- Respostas sensoriais intensas:
Crianças com TEA ou outras condições podem ter respostas sensoriais alteradas a texturas, sabores ou cheiros específicos, resultando em uma recusa severa de certos alimentos. Podendo ser muito intensa ou o completo inverso e buscar por estímulos. - Dificuldades motoras orais:
Problemas com a mastigação ou deglutição podem dificultar a aceitação de texturas e a variedade de alimentos. - Rigidez cognitiva:
Dificuldade em variar detalhes da rotina e do cardápio alimentar. Aceita apenas talheres e utensílios específicos, ingere comidas preparadas por pessoas específicas, ou ainda, tolera apenas o salgadinho insutrializado de uma determinada marca.
Ação e intervenção
Reconhecer esses sinais de alerta é o primeiro passo para abordar o grande guarda-chuva das questões alimentares. Se você observar qualquer um desses sinais na sua criança, é essencial buscar orientação profissional. Fonoaudiólogos, nutricionistas, psicólogos, terapeutas ocupacionais e pediatras podem trabalhar juntos para fornecer um diagnóstico preciso e desenvolver um plano transdisciplinar adequado.
A conscientização e a intervenção precoce podem fazer a diferença significativa na saúde e no bem-estar da criança, promovendo uma relação saudável com a comida e prevenindo complicações futuras. Fique atento aos sinais e não hesite em buscar ajuda quando necessário.
Sobre a autora:
Maria Fernanda Cestari de Cesar, formada em Fonoaudiologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em 2014, aprofundou seus conhecimentos ao obter um mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela mesma instituição em 2017. Em 2018, ela especializou-se em Fonoaudiologia Hospitalar no prestigiado Hospital Israelita Albert Einstein.
Aprofundando seu expertise internacionalmente, Maria Fernanda participou de cursos sobre seletividade alimentar infantil ministrados por renomadas especialistas da área, como Suzanne Morris, Marsha Dunn Klein, Kay Toomey e Holly Bridges. Além disso, enriqueceu sua formação com cursos focados em autismo e seletividade alimentar, respaldados por profissionais e plataformas de destaque no cenário acadêmico.
Em 2022, sua competência no tratamento de dificuldades alimentares foi reconhecida com a certificação pela Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia. Sua prática clínica é voltada ao atendimento de crianças e pré-adolescentes, tanto típicos quanto atípicos, enfrentando desafios alimentares.
Como autora, Maria Fernanda contribuiu para a literatura infantil com os livros ‘Francisco não gosta de comer?’ e ‘Miguel e o espectro de oportunidades alimentares’, além de desenvolver o jogo educativo ‘Alimentando Conversas’.
Ela também compartilha sua expertise como docente na pós-graduação do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein, no curso voltado ao Transtorno do Espectro do Autismo sob uma abordagem multiprofissional.